Biografia dos Dias sem Princípio
Coluna de Inês Peceguina
4 MIN DE LEITURA | Revista 50
Para o infinito e mais além: sobre as narrativas e o esquecimento.
Parte I {Parte II}
Ao ler esta observação, avoluma-se no meu corpo e desconforto. Fico intrigada. Espantada mesmo. Uma coisa é saber que se sabe. Outra é saber e pronto. É difícil compreender que este conhecimento seja uma descoberta recente. Não é. De certeza que desde muito cedo, desde que somos dependentes da sincronia com o outro, que é a raiz da ligação na nossa e em muitas outras espécies, que essa sabedoria existe. Quando é que se esqueceu? Como? Ou nunca se esqueceu, e foi operando na lógica da intuição, da presença, do estar absolutamente, ouvi absolutamente, mas de alguma forma, à medida que nos decidimos a provar, a demonstrar, a testar e precisar de evidência passíveis de medida, caímos numa espécie de cegueira.
Nesta perspectiva, que parte de uma matriz evolutiva e que, ao mesmo tempo, abre espaço para processos individuais e de complexidade maior, nomeadamente de natureza artística, prevalece a ideia de que a narrativa, as estórias, são o que confere sentido e significado às experiências, favorecendo a integração e a adaptação às diversas circunstâncias de vida de uma pessoa. No limite, as narrativas são uma espécie de mecanismo de criação de sentido, permitindo, não apenas dar sentido ou significado à experiência, mas também a sua própria construção e ressignificação (Gabriel, 2004). Ou seja, contêm uma qualidade de permeabilidade e de dinâmica.
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Para citar este artigo:
:PECEGUINA, Inês. Para o Infinito e Mais Além Sobre as Narrativas e o Esquecimento. – parte I. Vento e Água – Ritmos da Terra, https://ventoeagua.com/revistas-online/revista-50para-o-infinito-e-mais-alem-sobre-as-narrativas-e-o-esquecimento/, número 50, 2024
As narrativas da história humana e nas histórias humanas, ou da filogenia à ontogenia das narrativas de forma muito simplista, a filogenia refere-se à história evolutiva de uma espécie, enquanto a ontogenia diz respeito ao desenvolvimento individual de cada organismo dentro dessa espécie (Fink, 1982). Estes conceitos têm sido sobretudo utilizados no âmbito da biologia evolutiva, por exemplo, para explicar o desenvolvimento embrionário (Nelson, 1978), mas podem também ser boas metáforas para outros processos de desenvolvimento.
Inês Peceguina
PhD em Psicologia do Desenvolvimento e Pós-Doutoramento em Psicologia da Educação
Pessoa que se intriga.
Investigadora no Centro de Estudos e Pesquisa, da Operação Nariz Vermelho.
Com deambulações pelos territórios da Psicologia e da Educação.
Quase 12 anos de experiência no papel de mãe, a cometer os erros clássicos e mais alguns.
Pessoa que se encontra na escrita e que às vezes na escrita encontra o outro.
Bailarina de fim-de-dia e atleta de nascer do sol.