Ciclos da Terra e da Alma

Coluna de Íris Lican Garcia

2 MIN DE LEITURA | Revista 46

Quem és?

 

Se em vez de perguntar para que serve a Água, perguntassemos: quem és tu?
Se em vez de perguntar para que serve a areia, perguntassemos: quem és tu?
Será que a areia nos contaria, na desigual linguagem que teríamos de aprender, no tempo longo da areia e não no nosso tão curto, que já foi pedra, osso, raiz, átomo de estrela até se desfazer em grão?
Quanta memória carrega em si cada grão?
Como a objectificamos ao torna -la uma mera utilidade?
E a planta, será que nos contaria como é germinar, o que é ser chão e ao mesmo tempo ser a si mesma, o que é escutar o chamado do Sol e ser alimento e medicina do Bosque mas não de si mesma?
O que nos contaria cada planta, cada pedra, cada corpo vivo de água?
Se não aprendermos a escutar será que estamos verdadeiramente vivos?

Ou será que estamos numa espécie de morte em vida em que toda a natureza nos é utilitária e também nós somos utilitários e capitalizáveis? Infelizmente, a capitalização não é só económica, a percepção criada e incentivada de que tudo deve ser útil e produtivo é a base da nossa doença ecológica e de tantas doenças emocionais.

Muitas vezes, as pessoas mais geniais são as que mais dificuldade têm em encontrar sentido tanto em produzir como em consumir.
Será que uma empatia exclusivamente voltada para o nosso semelhante é uma verdadeira empatia? Ou será a verdeira empatia mais do que humana, extensível a todos os seres humanos e não humanos nas suas amplas diferenças de nós?
Porque escutar o semelhante é um eco da nossa voz, mas escutar o distintivo é um confronto, é aí mesmo que a empatia é uma prática e não um dado adquirido.
É nesta escuta afinada e constante que nos desconstrói a identidade social que ouvimos a Natureza primordial, dentro de nós, uns dos outros e à nossa volta.

Para mim, é com as plantas que aprendemos a qualidade da escuta e da generosidade: porque se há quem saiba escutar plenamente e testemunhar com resiliência o passar do tempo, são as árvores e plantas. Porque se há quem exista para se doar, são as árvores e as plantas.

Escutar cada uma pelo que é, não pelo que faz é o exercício maior dos xamanismo desde o neolitico.
Por isso: deixo no chão coração a prece. A passo a passo tecida.

Para citar este artigo:

GARCIA, Íris. Quem és?  Vento e Água – Ritmos da Terra, https://ventoeagua.com/revistas-online/revista-46/quem-es/, número 46, 2023

Porque escutar o semelhante é um eco da nossa voz, mas escutar o distintivo é um confronto, é aí mesmo que a empatia é uma prática e não um dado adquirido.
É nesta escuta afinada e constante que nos desconstrói a identidade social que ouvimos a Natureza primordial, dentro de nós, uns dos outros e à nossa volta.
Íris Garcia

Íris Garcia

Colunista e Autora regular da Revista

Sou a Íris. Sou Mãe, Terapeuta e Educadora Psico-Somática, Formadora de Fertilidade Consciente, Yoga Terapeuta, Doula, Mulher Medicina, Herbalista, Artista de Dança, Autora, Investigadora e ecologista. As minhas linguagens primeiras são a Natureza, a escrita e o movimento. Caminho, danço e escrevo desde que me recordo. O que me move é a vontade de cultivar equilíbrio sistémico a partir do respeito pela Natureza intrínseca de cada pessoa e sua experiência íntima e única,  em inter-conexão com as suas relações humanas e naturais, desde o lugar do corpo em proximidade orgânica com a Terra Viva.

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