Quando pensamos em Feng Shui pensamos em organizar a Casa. A primeira vez que ouvimos falar desta prática milenar e, se nos identificamos de alguma forma, queremos “harmonizar” e “equilibrar” a Casa. O que quer que isso queira dizer para cada um de nós!
Começamos então por procurar informação do que está certo ou errado e começamos a modificar a Casa, esperando mudanças externas na vida. Novas oportunidades de emprego, sanação de relacionamentos ou estabilização de uma novo projecto. Alterações que podem ou não ocorrer.
Com as dúvidas a aumentar podemos recorrer a um consultor para nos avaliar e interpretar o nosso espaço intimo, para que nos dê uma luzes do melhor e do pior a fazer. Onde estão os pontos fragilizados e os pontos fortes do nosso espaço e de que forma é que tudo isso interage com a nossa vida.
A questão é que a vida é dinâmica e sempre em mutação.
Quer isto dizer que nós, enquanto seres vivos, mudamos, transformamos, evoluimos (e involuimos) a cada ano, mês, dia e hora. Podemos correr o risco de, ao fazer uma consulta de Feng Shui num dado momento da vida, a informação e intervenções que dela constem não acompanhem as mudanças dinâmicas da nossa vida.
Como costumo referir em aulas e palestras, todos nós estamos codificados e temos a capacidade inata de praticar Feng Shui. Todos trazemos sensores fundamentais que nos informam que espaços são bons e que espaços nos drenam ou desafiam. Todos sabemos em que espaços nos sentimos bem ou não. Basta tomar a atenção e ouvir. Não apenas com a mente, mas com o coração.
O estudo da dos conceitos e a experiência prática associados ao Feng Shui é por isso um ampliar de algo que já sabemos. Um trazer à consciência de elementos basilares da forma primordial como nos relacionamos com o nosso contexto físico.
É importante não nos esquecermos que estamos permanentemente em relação com a nossa envolvente física. Não existimos no vácuo. Desde que nascemos até que morremos que estamos activamente nesta conversa com o ambiente que nos rodeia. A relação com a casa ou contexto não termina ou congela no momento em que uma consulta de Feng Shui termina.
Daí a importância de estudar esta arte ancestral humana. Para recordarmos o que já sabemos sobre os locais que habitamos, o que nos ajuda a relembramos quem somos.
A CHAVE DE OURO DA NOSSA CASA
Todos temos relações ricas com os nossos locais, que na maioria das vezes não são conscientes.
Quando estas relações se re-aprendem, desenvolvendo-se de forma intencional e consciente, percebemos que têm o potencial de nos guiar, ensinar, transformar e curar. Este é um caminho antigo e precisamos de afecto, integridade e compreensão profunda para retornarmos ao dom de honrarmos os espaços que habitamos para além da sua forma função.
Privilegiamos a comunicação não-verbal que se encontra nas partes mais antigas do nosso cérebro, no corpo e, principalmente no coração. Pois é uma relação basilar, com muitos fios de sabedoria que vivem em todos os cantos da terra viva, e nas várias gerações da existência humana que já os caminharam.
Quando estudamos Feng Shui reconhecemos algumas formas de abrir portas a esta sabedoria ancestral.
E há muitas formas de explorar estes caminhos. As várias abordagens mais técnicas e académicas geram conhecimento, mas a intuição e conexão genuína gera sabedoria.
Ao longo deste estudo e re-encontro, também relembramos esta relação profunda com a terra, em perpétuo estado de mudança e movimento, re-encontrando os catalisadores para que a alquimia da transmutação de vida se processe. Tanto das paisagens internas como externas.
Ao cultivar, nutrindo e cuidando, da paisagem interna da nossa intuição, esta pode tornar-se mais focada e precisa, exigindo de nós maior integridade e respeito por toda a vida. Libertamos camadas de preconceitos, projecções, medos e bagagem cultural, e assim conseguimos ouvir mais claramente a voz a nossa intuição assim como a sabedoria ancestral que todos carregamos.
Precisamos de voltar a aceder à diversidade das nossas capacidades que deixamos de usar. Precisamos de submergir para nos voltarmos a ligar às capacidades dormentes e às diferentes qualidades da nossa inteligência. Esta é a sabedoria do corpo e do coração, quando acordam. Não é novo, mas bem antigo, apenas esquecido e rejeitado pelo nosso contexto cultural. É a sabedoria dos nossos antepassados, escondida em plena vista na profundidade dos nossos ossos e genes. Mas também nas montanhas e rios.
Ao estudar Feng Shui podemos encontrar muitas camadas de resistências antes de aceder a estas subtilezas. É um caminho de desaprender, retirar ilusões, julgamentos e expectativas, voltando ao estado de percepção inocente. Esta tarefa de retirar camadas da armadura dos preconceitos é o mais difícil.
Lentamente (re)descobrimos novos territórios onde ouvimos o corpo e a casa reais. Ao início estas novas paisagens de acesso podem ser confusas, por serem locais desconhecidos.
O estudo de Feng Shui transcende as paredes de uma casa, sendo um percurso multi-dimensional de auto-descoberta.
Estudar Feng Shui traz a recordação da ferramenta da e para a vida, que nos ajuda a integrar opostos, vivendo a Casa e Vida de forma mais plena e consciente.
Parte deste artigo foi inspirado em passagens do livro Intuitive Herbalism: Honouring Our Indigenous Plants. Walking the Path of Healing de Nathaniel Cheairs Hughes com ilustrações de Fiona Owen.
Artigo escrito para a revista número 22, Vento e Água.